sábado, maio 03, 2008

Cadê você?

Eles estavam voltando tarde para casa, num passo que só Deus saberia dizer quando enfim chegariam - se é que chegariam. Já era o terceiro ônibus que se recusara a parar, passando apressadamente pelo farol vermelho (numa hora daquelas...). Ninguém falava. A paisagem não era das melhores: becos macabros e muitas poças no chão lamacento. Ah é, estava chovendo. Há cerca de trinta minutos, foram calorosamente esconjurados do bar por falta de porte. No entanto, pareciam assim: felizes.
Dessa forma, continuaram a lenta caminhada sob um céu Cem Estrelas cantarolando em uníssono (e ignorando olhares de urinadores-de-postes assustados) algo do tipo:

"Cadê você, que cantou com a minha voz
e olhos tímidos aquele sermão tão triste?
Cadê você, que chorou saudades?
E hesitou quando tudo pareceu tão simples"


Até que a caminhonete desgovernada mergulhou espalhando a noite em vermelho enquanto o sol tímido procurava pelo seu lugar. E eles não mais voltaram a procurar por ela.

quinta-feira, maio 01, 2008

O Viúvo da Ponte

Certo feriado de sexta-feira frio e seco. Um carrinho de pipoca fechado, 17h55min, um pedaço de papel voando sob uma ponte e caindo, em seguida, no mar. A mulher parada sentindo o vento gelado cortar sua pele; o homem chegando no momento que o relógio da igreja batia e os pássaros levantavam vôo assustados.


- Você... - surpreendeu-se ele.

- Hum?

- Eu te amo.

- Tu... o quê?

- Te amo.

- Mas você não me conhece.

- Não posso te amar, então?

- C-como...

- Viu, você me ama também.

- Como sabes?

- Se não me amasse, você não teria parado pra pensar.

- Faz sentido.

- Então, vamos?

- Pra onde?

- Casar.

- Casar?

- Casar.

- Onde?

- Pode ser naquela igreja, se assim preferir, mas não tenho religião.

- Também não tenho.

- Que bom, assim combinamos mais.

- Verdade. Então, teremos filhos? Sempre quis ser mãe, mas nunca tinha amado ninguém antes...

- Não.

- Não?! Por que?

- Porque não amo você.

- Mas você disse até agora, você me convenceu a mudar de idéia!

- É, sim, fiz isso.

- Por que você fez isso!?

- Porque gosto que todos me amem.

- Vamos pelo menos conversar!

- Adeus.


Dessa forma, ele partiu e só se pôde ouvir o desespero do pranto da mulher.